M. tuberculosis

M. tubérculosis é o principal agente etiológico da tuberculose no homem. O bacilo apresenta variação de 0,3 a 0,6um. É um patógeno intracelular de macrófagos, que estabelece sua infecção preferêncialmente no sistema pulmonar: tem a ação regulada pelo sistema imune do hospedeiro e, na maioria das vezes, é condicionado a um estado de dormência. O tempo de geração é de aproximadamente 24 horas, tanto em meio sintético, como em animais infeccionados. A partir do crescimento do organismo em ambiente laboratorial, ocorre a formação de colônias com superfície seca e rugosa e, para que as mesmas se tornem visíveis, são necessárias de três de três a quatro semanas de crescimento na placa.

A partir do sequenciamento completo do genoma da linhagem mais bem caracterizada, o M. tuberculosis H37Rv  determinou que o cromossomo circular possuísse 4.411.529 pares de base, e conteúdo de Guanina mais Citosina em de aproximadamente 65,6%. Desde seu isolamento, em 1905, esta linhagem tem aplicação mundial na pesquisa biomédico devido á total retenção de virulência em modelos de tuberculose animal, além de ser susceptível a drogas e amena á manipulação genética.

O exame da composição de aminoácidos do proteoma de M. tuberculosis revelou uma significativa preferência estatística pelos aminoácidos alanina, prolina  arginina e triptofano, todos codificados por códons ricos em G mais C, e uma considerável redução na utilização de aminoácidos codificados por códons ricos em Adenina e Timina (T mais A), como asparagina, isoleucina, lisina, fenilalanina e tirosina. Uma descoberta surpreendente foi a de que um conjunto de elementos variáveis, as seqüências polimórficas ricas em G mais C, correspondem a uma família de seqüências que codificam proteínas com pequenos motivos peptídicos, PE e PPE, ricas em glicina, organizadas em domínios repetitivos comuns. Estas proteínas, que representam aproximadamente 10% da capacidade codificante de genoma aparentam ser remanescentes daquelas ligadas á variação antigênica em outras bactérias. Entre algumas proteínas secretadas identificadas pela seqüência genômica e que poderiam atuar como fatores de virulência estão as fosfolipases C.lípases e esterases, que podem atacar membranas celulares ou vacuolares, assim como algumas proteases. Uma das fosfolipases está relacionada com a persistência do bacilo no ambiente fagossômico, que é limitado em nutrientes.

Dormência e Reativação doMycobacterium Tuberculosis

 

A tuberculose latente caracteriza-se por ser uma síndrome clínica decorrente da exposição ao M. tuberculosis, do estabelecimento da infecção. Ao contrário da doença ativa, a tuberculose latente não se caracteriza como uma doença infecciosa e, portanto, não se representa um risco á saúde pública.

Por outro lado, condições imunossupressívas comprometem a eficácia do sistema imune, permitindo a reativação do bacilo até então dormente, e levando o indivíduo a desenvolver tuberculose ativa, freqüentemente muitas décadas após a infecção inicial. Para ter-se uma idéia, estima-se que o risco de ocorrer o desenvolvimento de tuberculose ativa entre pessoas co-infectadas com HIV e M. tuberculosis é de cerca de 8%/ano, comparado com 10% de risco ao longo vida para pessoas infectadas apenas pelo bacilo. Entre pacientes com AIDS, imunodeprimidos, podem ocorrer infecções oportunistas causadas pelas denominadas micobactérias atípicas. Atualmente, a infecção por HIV representa o maior risco para a progressão de uma infecção latente para a doença ativa. Ainda, a tuberculose induz o desenvolvimento de AIDS em pacientes HIV positivos pela produção de citocinas estimulatórias e redução  do número de células TCD4+ no organismo. Portanto, a co-infecção por M. tuberculosis e HIV representa um problema de efeito devastador, tanto para pacientes infectadas como para a população em geral.

Pode-se dizer que a infecção por HIV alterou drasticamente a epidemiologia e a história natural da tuberculose, causando um aumento na sua dinâmica de transmissão, morbidade e mortalidade. O diagnóstico de tuberculose entre pacientes HIV positivos tornou-se mais difícil devido a fatores como: falsos negativos nos testes de tuberculina; achados atípicos em raios X torácicos de tuberculose pulmonar; quando pulmonar com esfregaço de escarro negativo para bacilos álcool-ácido resistentes; tuberculose extra-pulmonar. É evidente que a epidemia de HIV favorece o surgimento de linhagens de bacilos resistentes a drogas em pacientes co-infectados, uma vez que, nestes casos, há um maior índice de abandono do tratamento, além de facilitar uma rápida disseminação destas linhagens para outras pessoas. Em pacientes HIV positivos infectados por MDR-TR, os índices de mortalidade freqüentemente superam 80%, com intervalos entre o diagnóstico e a morte variando entre quatro a 16 semanas, fazendo com que MDR-TR  seja conhecida como a mais maligna infecção oportunista á infecção por HIV.

 

Diagnóstico

Diagnóstico - São fundamentais os seguintes métodos:

 

1) Clínico - Baseado nos sintomas e historia epidemiológica. Os casos suspeitos de Tuberculose em crianças e adolescentes devem ser encaminhados para a unidade de referência, para investigação e confirmação do diagnóstico. Apos definição do diagnóstico e estabelecido o tratamento, a criança devera voltar para acompanhamento na Unidade Básica de Saúde.

 

2) Laboratorial -  Exames bacteriológicos.

 2.1. Baciloscopia direta do escarro - É o método prioritário, permite identificar o doente bacilífero. Método simples e seguro, devem ser realizados por todos os laboratórios. A baciloscopia direta devera ser indicada para todos os sintomáticos respiratórios (indivíduo com tosse e expectoração por três semanas e mais). Devera ser dada ênfase, para realização deste exame, em pacientes que apresentem alterações pulmonares na radiografia de tórax e nos contatos de Tuberculose pulmonar bacilíferos. Também e utilizada para acompanhar a evolução bacteriológica do paciente pulmonar, inicialmente positivo, durante o tratamento. O controle bacteriológico deve ser de preferência mensal e, obrigatoriamente, ao término do segundo, quarto e sexto mês de tratamento.

 

Recomenda-se, para o diagnóstico, a coleta de duas amostras de escarro: uma por ocasião da primeira consulta, e a segunda na manhã do dia seguinte, ao despertar.

 

2.2. Cultura de escarro ou outras secreções - E indicada para suspeitos de Tuberculose pulmonar negativos ao exame direto do escarro, e para o diagnóstico de formas extra pulmonar, como meníngeo, renal, pleural, óssea e ganglionar, e também para o diagnóstico de Tuberculose em pacientes HIV positivo. Também esta indicada a solicitação desse exame acompanhado do teste de sensibilidade, nos casos de suspeita de resistência bacteriana as drogas, ou ao final do segundo mês de tratamento quando a baciloscopia se mantém positiva, retratamento após falência ao esquema básico ou reinicio apos abandono. Nos casos de suspeita de infecção por micobactérias não-tuberculosas, notadamente nos doentes HIV positivos ou com AIDS, além de cultura, devera ser realizada a tipificação do bacilo.

 2.3. Exame radiológico - E auxiliar no diagnóstico da Tuberculose, justificando-se sua utilização, se possível, nos casos suspeitos. Este exame permite a identificação de pessoas portadoras de imagens sugestivas de Tuberculose, ou de outras patologias. O exame radiológico, em pacientes com baciloscopia positiva, tem como função principal, a exclusão de outra doença pulmonar associada, que necessite de tratamento concomitante, além de permitir avaliação da evolução radiológica dos pacientes, sobretudo daqueles que não responderam a quimioterapia.

2.4. Tomografia computadorizada do tórax - Método diagnóstico útil, notadamente a tomografia computadorizada de alta resolução, em alguns casos em que a radiografia do tórax apresenta resultados imprecisos, por alterações parenquimatosas mínimas ou por não permitir distinguir lesões antigas das lesões da Tuberculose ativa. No entanto, e método de maior custo e menor oferta, restrito aos centros de referência. Deve ser usado de forma individualizada, levando em consideração os recursos disponíveis e o custo-benefício, especialmente nos casos com baciloscopia negativa que exigem melhor diagnóstico diferencial com outras doenças.

 

2.5. Broncoscopia - A broncoscopia e os procedimentos a ela associados, a exemplo de lavado brônquico, lavado bronco alveolar, escovado brônquico, biopsia brônquica, biopsia transbrônquica e punção aspirativa com agulha podem ser úteis no diagnóstico da Tuberculose nas seguintes situações: formas negativas a baciloscopia, suspeita de outra doença pulmonar que não a Tuberculose, presença de doença que acomete difusamente o parênquima pulmonar, suspeita de Tuberculose endobrônquica ou pacientes imunodeprimidos, particularmente os infectados pelo HIV.

 2.6. Prova tuberculínica - Indicada, como método auxiliar, no diagnóstico da Tuberculose, em pessoas não vacinadas com BCG ou indivíduos infectados pelo HIV. A prova tuberculínica quando positiva, isoladamente, indica apenas a presença de infecção, e não e suficiente para o diagnóstico da Tuberculose doença.

No Brasil, a tuberculina usada é o PPD RT23, aplicado por via intradérmica, no terço médio da face anterior do antebraço esquerdo, na dose de 0,1ml, equivalente a 2UT (unidades de tuberculina). Quando conservada em temperatura entre 4° e 8°C, a tuberculina mantém-se ativa por seis meses. Não deve, entretanto, ser congelada, nem exposta a luz solar direta. A técnica de aplicação e o material utilizado, são padronizados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), e tem especificações semelhantes as usadas para a vacinação BCG. A injeção do liquido faz aparecer uma pequena área de limites precisos, pálida e de aspecto pontilhado, como casca de laranja. A leitura da prova tuberculínica é realizada de 48 a 72 horas após a aplicação, podendo este prazo ser estendido para 96 horas, caso o paciente falte a consulta de leitura na data agendada.

O maior diâmetro transverso da área de endurecimento palpável deve ser medido com régua milimetrada, e o resultado, registrado em milímetros. (Não será mais utilizada a classificação de forte ou fraco reator). A interpretação do resultado depende da probabilidade de infecção latente, do risco de adoecimento por TB, do tamanho do endurado e da idade.

 

Observações em relação à prova tuberculínica

 

Algumas circunstâncias podem interferir no resultado da prova  tuberculínica como, por exemplo: Tuberculose grave ou disseminada, desnutrição, AIDS, sarcoidose, neoplasias, doenças linfoproliferativas, tratamentos com corticosteróide e drogas imunodepressoras, gravidez

 

Todos os indivíduos infectados pelo HIV devem ser submetidos a prova tuberculínica. Enduração ≥ 5mm reflete infecção latente, para qual deve ser iniciada a quimioprofilaxia (ou tratamento da infecção latente) com isoniazida, após exclusão de Tuberculose ativa. Para pacientes com enduração entre 0 e 4 mm, e em uso de terapia anti-retroviral, recomenda-se fazer o teste seis meses Após o  inicio da terapia, devido a possibilidade de restauração da resposta tuberculínica e anualmente apos a recuperação (reconstituição) imune. Nos indivíduos imunizados ha ate 2 anos, a prova tuberculínica deve ser interpretada com cautela porque, em geral, apresenta reações de tamanho médio, podendo alcançar 10mm ou mais.

 

2.7. Exame anátomo-patológico (histológico e citológico) - Sempre que possível, nas formas extra pulmonares, deve-se realizar a biopsia. No material colhido será feito o exame direto, a cultura e o exame anátomo-patológico, para identificar o M. tuberculosis, ou o processo inflamatório granulomatoso compatível com a Tuberculose.

 

2.8. Exames bioquímicos - São mais utilizados em casos de Tuberculose extra-pulmonar, principalmente no derrame pleural, derrame pericárdico e meningoencefalite tuberculosa.

 

2.9. Exame sorológico e de biologia molecular - Esses novos métodos são úteis para o diagnóstico precoce da Tuberculose, contudo a sensibilidade, especificidade e valores preditivos variáveis, aliados ao alto custo e complexidade, os inviabilizam como exames de rotina, ficando seu uso restrito a alguns centros de pesquisa.

Observação: Exame sorológico anti-HIV deve ser oferecido o mais cedo possível a todo individuo com diagnóstico estabelecido de Tuberculose, independentemente da confirmação bacteriológica. O profissional de saúde deve abordar a possibilidade de associação das duas infecções e dos benefícios do diagnóstico e tratamento precoces da infecção pelo HIV, realizando aconselhamento pré-teste. O teste anti-HIV deve ser realizado com o consentimento do paciente, observando se o sigilo e confidencialidade do teste, utilizando-se o algoritmo de diagnóstico com testes rápidos sempre que possível. Independente do resultado da tietagem, deve ser realizado aconselhamento pós-teste. Caso o exame seja positivo, o doente deve ser encaminhado para um serviço ambulatorial especializado (SAE) no tratamento da infecção do HIV e AIDS, mais próximo de sua residência

 

Diagnóstico diferencial - Pneumonias, micoses pulmonares (paracoccidioidomicose, histoplasmose), sarcoidose e carcinoma brônquico, dentre outras enfermidades

Tratamento

Tratamento - O tratamento da Tuberculose deve ser feito em regime ambulatorial, supervisionado, no serviço de saúde mais próximo a residência do doente. Antes de iniciar a quimioterapia, e necessário orientar o paciente quanto ao tratamento. Para isso, deve-se explicar, em linguagem acessível, as características da doença e o esquema de tratamento que será seguido - drogas, duração, benefícios do uso regular da medicação, conseqüências advindas do abandono do tratamento, e possíveis efeitos adversos dos medicamentos. Principal estratégia do novo modelo de atenção ao paciente com Tuberculose, o DOTS,

 

DOTS - Estratégia de Tratamento Diretamente Observado, é fator essencial para se promover o real e efetivo controle da Tuberculose. A estratégia DOTS visa o aumento da adesão dos pacientes, maior descoberta das fontes de infecção (pacientes pulmonares baculíferos), e o aumento da cura, reduzindo-se o risco de transmissão da doença na comunidade. As drogas usadas, nos esquemas padronizados, são as seguintes:  Isoniazida - H; Rifampicina – R; Pirazinamida – Z;  Etambutol – E

Em crianças menores de cinco anos, que apresentem dificuldade para ingerir os comprimidos, recomenda-se o uso das drogas, na forma de xarope ou suspensão.

Em agosto de 2008, o Comitê Técnico Assessor do Programa Nacional de Controle da Tuberculose, recomendou a inclusão do Etambutol, para adultos e adolescentes (>10 anos de idade), no tratamento de primeira linha da Tuberculose no Brasil. Desse modo, esta recomendado o uso de Rifampicina, Isoniazida, Pirazinamida e Etambutol na primeira fase do tratamento durante dois meses seguidos de Rifampicina e Isoniazida durante quatro meses, mantendo dessa forma o regime de curta duração de 6 meses. Para crianças ( > 10 anos de idade) continua a recomendação com 3 fármacos na 1a fase (RHZ) e 2 fármacos (RH) na 2a fase.

  • 1º. Fase ( ou de ataque) - As 4 drogas preconizadas serão administradas

em comprimidos compostos por dosagens fixas de Rifampicina – 150mg, Isoniazida – 75mg, Pirazinamida – 400mg e Etambutol –275mg.

  •  2º. Fase (ou de manutenção )  - As 2 drogas preconizadas serão administradas em comprimidos com dosagens fixas de Rifampicina – 150mg e Isoniazida – 75mg.  Estes comprimidos denominados dose fixa combinada (DFC incorporam 2 ou 4 drogas em proporções fixas. O uso destas apresentações traz uma serie de vantagens para o controle da Tuberculose:

 

Menor emergência de resistência bacteriana, uma vez que a DFC incorpora múltiplas drogas em um único comprimido e com isso diminui a chance de monoterapia;

 

Facilita a prescrição médica e a entrega das drogas na farmácia, o que pode ser altamente desejável em serviços de atenção básica onde os profissionais estão pouco familiarizados com o tratamento da Tuberculose;

Número reduzido de comprimidos  o que pode melhorar a adesão do paciente ao tratamento.  Apesar de todos os benefícios da DFC, ela não garante a ingestão dos comprimidos pelos pacientes. Portanto, e fundamental o controle efetivo do tratamento e a implementacao do DOTS.